domingo, 3 de abril de 2011

Um basta no racismo, zagueiro do Vasco Dedé e técnico
 do Bango Marcão são frutos de um passado de lutas.
 (Foto: Cleber Mendes)
O duelo marcado para hoje de Vasco e Bangu não se limita a um simples jogo de futebol, o encontro é um marco na história do esporte e do racismo, a estréia do terceiro uniforme do time da casa traz a tona todo o sentimento e simbolismo do pioneirismo na luta contra o preconceito no futebol. Trata-se de uma armadura negra, sem adorno transversais e marcado por um símbolo e uma inscrição que detalha o lema vascaíno que impulsionava essa batalha: Respeito e Igualdade. Mais do que um simples jogo de futebol, a partida válida pela 6° rodada do campeonato carioca também relembra as origens do time alvi-rubro, o primeiro clube da história do futebol do Rio a escalar um jogador negro. Em um amistoso contra o Fluminense, o Bangu foi a campo em um misto de nações, na qual encontrava-se estrangeiros oriundos da Itália, Inglaterra e Portugal, no mesmo elenco havia o único representante do Brasil, o meia Francisco Carregal, um mestiço filho de um português e mãe brasileira negra. O pioneirismo abriu as portas aos clubes que iniciaram a descentralização do futebol e ao início da década de 20, período em que minava a ignorância e prevalecia o elitismo, ascendeu uma nova equipe que ameaçaria os grandes da época (Fluminense, Flamengo e Botafogo), recém campeão da 2° divisão, o Vasco da Gama incomodaria os cartolas e despertaria o popular. Sagrando-se campeão no ano de 1925, os camisas negras encerrariam ali a superioridade das raças no futebol carioca, e gerou uma profunda revolta entre os outros. A indignação e o preconceito veio por meio de carta, na qual os tais grandes determinavam a eliminação dos negros no campeonato, algo que o clube da colina recusou de imediato enviando uma resposta escrita, lutando ao lado de seus atletas disputou outra liga e a venceu. Já o Bangu por ser amedrontado por represálias aceitou as condições impostas. O ato cruzmaltino causou um enorme frisson nas camadas populares, e com o povo ao lado viu-se os que se declaravam grandes renderem-se a tolerância e delegou a exclusão da tal ordem. O retorno da atitude do Vasco pode ser visto pela miscigenação do futebol, caracterizado primordialmente pelos clubes da peleja de hoje à tarde, por seus principais atletas serem de origem afro-descendente: Dedé, Zagueiro da casa, e Marcão, Técnico do Bangu e que iniciou a sua carreira na equipe rival. Infelizmente ainda nos deparamos com atos que relembram os tais grandes e não por coincidência os criminosos contemporâneos se auto nomeiam o mesmo...

Confira na íntegra a mais bela página do esporte brasileiro na luta contra o racismo defendido incessantemente pelos outros grandes times que tinham verdadeira aversão à participação de negros e pobres na vida social do país e ao vídeo Camisas negras que relembra a história contra o preconceito:


Rio de Janeiro, 7 de Abril de 1924.
Ofício nr. 261
Exmo. Sr. Dr. Arnaldo Guinle M.D.
Presidente da Associação Metropolitana de Esportes Atléticos
As resoluções divulgadas hoje pela imprensa, tomadas em reunião de ontem pelos altos poderes da Associação a que V.Exa tão dignamente preside, colocam o Club de Regatas Vasco da Gama numa tal situação de inferioridade, que absolutamente não pode ser justificada nem pela deficiência do nosso campo, nem pela simplicidade da nossa sede, nem pela condição modesta de grande número dos nossos associados.
Os privilégios concedidos aos cinco clubes fundadores da AMEA e a forma por que será exercido o direito de discussão e voto, e feitas as futuras classificações, obrigam-nos a lavrar o nosso protesto contra as citadas resoluções.
Quanto à condição de eliminarmos doze (12) dos nossos jogadores das nossas equipes, resolve por unanimidade a diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama não a dever aceitar, por não se conformar com o processo por que foi feita a investigação das posições sociais desses nossos consócios, investigações levadas a um tribunal onde não tiveram nem representação nem defesa.
Estamos certos que V.Exa. será o primeiro a reconhecer que seria um ato pouco digno da nossa parte sacrificar ao desejo de filiar-se à AMEA alguns dos que lutaram para que tivéssemos entre outras vitórias a do campeonato de futebol da cidade do Rio de Janeiro de 1923.
São esses doze jogadores jovens, quase todos brasileiros, no começo de sua carreira e o ato público que os pode macular nunca será praticado com a solidariedade dos que dirigem a casa que os acolheu, nem sob o pavilhão que eles, com tanta galhardia, cobriram de glórias.
Nestes termos, sentimos ter que comunicar a V.Exa. que desistimos de fazer parte da AMEA.
Queira V.Exa. aceitar os protestos de consideração e estima de quem tem a honra de se subscrever,
(a) Dr. José Augusto Prestes
Presidente




Por Vitor T. Abrantes 

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